quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Provando por absurdo

Uma das técnicas de prova dentro da matemática é a redução de um raciocínio a um absurdo. Quando eu ouvi esta expressão pela primeira vez, lembro de ter me perguntado: "Ué, mas se o raciocínio foi levado a um absurdo, isto é de alguma valia?". Por incrível (ou seria absurdo?) que pareça, isto diz muita coisa. A ideia da prova por absurdo é que, se há a princípio apenas duas maneiras de algo existir, e uma delas conduz a conclusões absurdas, então é porque a outra alternativa é, na verdade, a única possível de ocorrer na prática.

Vejamos um exemplo: suponha que uma pessoa esteja sendo julgada por assassinato. Por princípio, independentemente da pessoa em si que esteja sendo julgada, ela pode ou não ser culpada (só há estas duas alternativas). Se houver uma prova cabal de que ela estava em outro lugar no instante do crime (uma testemunha, um registro inquestionável dela em outro lugar, etc.), então concluímos que é um absurdo que o réu estivesse no local do crime pois, a cada momento, um corpo só pode estar em um único ponto físico (nota para os fisicos quânticos: perdoêm a minha simplificação da realidade). Logo, é absurdo que esta pessoa seja culpada do assassinato sendo, portanto, inocente.

É tão simples quanto isso. E uma gama imensa de problemas matemáticos, bem maior do que deve estar imaginando, são provados desta forma. Isto mostra como a natureza da matemática é simples. As pessoas que complicam demais. Eu já escrevi uma outra postagem sobre como problemas que parecem complicados são, em verdade, fáceis quando apresentados em outra linguagem a que nos é familiar.

Tocando neste assunto...

Estava levando minha filha de quatro anos para a escola e vimos um carro quebrado na rua sendo guinchado. Ela achou o cena o máximo.

-- Papai, porquê aquele carro está sendo levantado pelo maior?  -- ela me perguntou.

-- É porquê o menor quebrou, e o maior está levantando ele para carregá-lo até uma oficina.

-- Ahhhh... ele vai levar ele no "colo" ?

-- Isso! -- achando engraçado a analogia.

-- E se o maior quebrar?

Uau. Bem pensado! Meus olhos brilharam com a oportunidade sutil de fazer a matemática parecer algo legal.

-- Pois é... aí eles trazem um caminhão maior ainda para carregar o outro.

-- Ah....

-- E se este maior também quebrasse, hein?! Já pensou?

-- Hmmm... ah, papai, aí eles iam trazer um caminhão maior ainda!

-- Isso!... Mas ele também pode quebrar....

-- É, aí agente ia ter que trazer um caminhão maior, e maior, até ficar do tamanho do mundo!... (no finalzinho, percebi pelo retrovisor que ela fez um cara de que havia algo de errado com a conclusão)

-- Pois é... e mesmo que houvesse algum caminhão do tamanho do mundo, e ele quebrasse??

-- É mesmo.... e agora !??!

-- Nossa, é mesmo.... e agora?

Pensou um pouco. E respondeu:

-- Ah, mas aí então dá para empurrar o caminhão, ao invés de colocar ele no "colo".

Esta era outra alternativa. Para transportar um objeto, ou se carrega ou se empurra ele. O método de carregar um objeto que carrega outro que carrega outro etc. leva a um absurdo (que existem caminhões do tamanho do mundo - e ainda maiores!). Logo, carros quebrados forçosamente devem, em algum momento, ser empurrados ao invés de carregados. Ela se convenceu disso provando por absurdo. E depois foi brincar de massinha na escola.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Dedicatórias

Sempre que leio um livro, não deixo de olhar o prefácio e as dedicatórias. Em geral, as pessoas pulam estas seções, e vão direto "ao que interessa". Acho importante ler também estas partes pois geralmente elas são os únicos lugares nas quais o autor revela sua verdadeira personalidade dado que o objeto de discurso é pessoal. Isto não acontece no corpo do livro, cujo conteúdo é na maior parte das vezes, ao menos no meu caso, ou ficção ou de cunho técnico.

Por falar em livro técnico, estava folheando o livro "Fundamentals of Database Systems" (Elmasri/Navathe) e me deparei com a seguinte dedicatória (traduzida) de Elmasri:

Para Katrina, Thomas e Dora (e também para Vicky).

Achei muito peculiar a posição de Vicky em relação à Katrina, Thomas e Dora. Eu, por exemplo, interpretei a dedicatória assim:

Para Katrina, Thomas e Dora. (Ah, e também para Vicky! Ufa, quase me esqueci.)

Não vejo muita explicação razoável para o autor ter separado Vicky assim, tão explicitamente. Se ele gostaria de dedicar o livro a ele, por que minimizar sua importância desta maneira? Bem, vejo sim uma situação possível. O Vicky pode ser um animal de estimação e o autor não gostaria de elevá-lo à mesma categoria dos demais. Neste caso, eu não gostaria de estar na pele daqueles entes e amigos íntimos do autor que não entraram na dedicatória.

Tocando neste assunto...

Afinal de contas: qual o critério para se aparecer ou não numa dedicatória? Seria citar aqueles que mais contribuíram para a realização do trabalho? Aqueles a quem se ama?  Aqueles com nome curto?! Sim, pois os espaços para dedicatórias são sempre pequenos e cada nome ali tem que ser cuidadosamente planejado. É quase como decidir comprar um novo móvel para os apartamentos (leia-se: a-per-ta-men-tos) de hoje em dia, onde cada centímetro quadrado faz a diferença entre ter ou não uma mesa de centro. Ou ainda em escolher os convidados para a festa de casamento, com os preços abusivos dos cerimoniais, que cobram por pessoa, incluindo as namoradas dos filhos daquela tia que mora longe, que há muito você não vê, mas tem obrigação de chamar. Esta decisão consciente na nomeação da dedicatória agrava ainda mais a situação, pois quem fica de fora tem razão de sobra de ficar chateado.

Defendo que, além das dedicatórias, devesse existir a seção de Difamatórias. "Ao meu antigo chefe, que dizia ter sido um erro eu largar aquele emprego para me graduar.", seria uma boa. Ou quem sabe "Ao meu chefe, por ter me feito trabalhar duro, incluindo finais de semana e feriados, de maneira que eu fui forçado a me especializar em banco de dados a ponto de escrever este livro". Pensando bem, já sei por que difamatórias não existem. A indiferença dói mais do que o ódio declarado.

No meu caso, nunca tive que escrever muita coisa que abriam a possibilidade de dedicatória além das minhas teses e monografias. Mesmo assim, quis o destino que a minha filha esteja incluída em uma dedicatória a mais do que meu filho por ter nascido antes. Tenho certeza que isso me trará confusão um dia, numa discussão destas qualquer de porquê eu deixo ela fazer algo que ele não pode. Para amenizar este problema, gostaria de dedicar esta postagem a você, meu filho!

O mundo era perfeito

Quando eu era criança, eu achava que o mundo era perfeito. Não que eu tivesse nascido em berço de ouro, muito pelo contrário. E nem que eu t...