quarta-feira, 27 de abril de 2011

Vendo a vida pelas lentes certas

Há muitos meses atrás, estávamos voltando de viagem -- nem me lembro mais de onde -- quando resolvemos dar uma parada em Búzios. O objetivo era passar uma tarde passeando pelo centro e visitar aquelas lojinhas que existem por lá. Além de haver tempo no nosso programa para uma parada, Búzios era caminho de volta mesmo, portanto não nos custava muito.

Logo que chegamos, demos de cara com uma loja que vendia óculos escuros. Aliás, vendia na verdade somente óculos escuros. Como eu estava precisando comprar um, resolvi entrar. Reparei que a loja era bem decorada e organizada e a vendedora logo se mostrou interessada em fazer um bom atendimento, o que me causou uma boa primeira impressão. Experimentei alguns e não demorou muito para encontrar um que era do jeito que queria. Caía bem no rosto, escurecia na medida em que eu achava ideal e tinha o design que eu gostava. Havia porém dois problemas: era relativamente caro e não tinha marca. Nenhuma. Nem aquelas marcas malucas que vemos por aí em tantos produtos genéricos, que parecem que foram decididas no momento da fabricação: "E aí Jorge, que marca colocamos agora neste outro tênis que fabricamos?" "Ah, sei lá, vamos escrever Naique?" "Demorou!" "E neste outro?" "Sem ideia... que tal Ultra Splash?" "Ficou legal, olhe só!"

Eu fiquei na dúvida se levava. Gastar um tanto razoável para levar algo cuja qualidade era duvidosa me deixou reticente. No fim, como tinha gostado da loja, acabei comprando. Ao sair, a vendedora ainda me disse: "Ah, esqueci de mencionar: estas lentes são polarizadas, evitando que fontes luminosas atrapalhem a visibilidade do motorista!".Será? Como eu já tinha pago e já estava de saída, não havia motivação para ele fornecer uma informação falsa. Por outro lado, como nem marca os óculos tinham, ficava difícil de acreditar.

O primeiro fato interessante que notei usando os novos óculos era que, no volante, ao se olhar os vidros das janelas laterais e traseira, eles pareciam ser formados de partes mais escuras e mais claras. Esta diferença de tonalidade não era aleatória. O padrão de claro-escuro se repetia uniformemente ao longo de cada vidro. Sem os óculos, estes mesmos vidros eram perfeitamente homogêneos. De fato, os óculos estavam de alguma forma levando a luminosidade em conta, o que interpretei como indício de que a compra tinha sido acertada.

Um segundo fato inusitado eu só percebi estes dias, o qual me motivou a escrever esta postagem. Subindo uma serra durante uma viagem, olhei de lado como de costume para admirar os mares de morros que existem por aqui, na nossa região do Rio. Ao longe, percebi um arco-íris fora do comum. Isto já tinha se repetido algumas vezes nos últimos tempos. Desta vez, devido a sua beleza diferente, resolvi fazer um comentário.

-- Nossa, que arco-íris bonito, veja só....

-- Que arco-íris? -- perguntou minha esposa.

-- Aquele, olhe lá.

-- Mas não tem nenhum arco-íris lá!

Quando tirei os óculos, puf! O arco-íris sumiu. Só então percebi que aqueles arco-íris que eu vinha vendo eram particulares. Não eram irreais, pois um arco-íris é simplesmente o produto que nos chega aos olhos de uma refração em algum meio da luz branca. No meu caso, esta refração estava ocorrendo nas lentes dos óculos, ao invés de ser nas usuais gotículas de água suspensas ao ar em dias de chuvas. Portanto, tratava-se um arco-íris legítimo, embora particular.

Creio que a felicidade possui certa analogia com isso. Existe na vida beleza que em geral é visível a todos. Porém, nem sempre a felicidade está assim tão visível. Às vezes, é necessário se usar lentes apropriadas para enxergar a sua beleza. E não se trata de se enganar: ver o lado positivo das coisas é, análogo ao arco-íris particular, tão autêntico quanto qualquer outra forma de felicidade. É como dizem: a beleza está nos olhos de quem vê.

Tocando neste assunto...

Passando pelo centro hoje, notei uma ótica que tinha um cartaz grande na frente: "Entre e teste a qualidade dos seus óculos escuros". Com a possibilidade de uma prova real da qualidade dos meus, entrei. A loja possuía uma máquina, que parecia um microscópio no qual uma luz branca atravessa a lente dos óculos sendo testados e, em alguns segundos, uma computador acoplado imprime os testes realizados, tais como proteção contra raios UVA, UVB, etc. Felizmente, o meu foi aprovado em todos os itens. Ao sair da loja satisfeito, pois enfim tive a certeza de que não fui enganado, ainda ouvi o balconista: "Ah, e só como informação adicional, a máquina diz que estas lentes são polarizadas!". Disto, eu tinha certeza já.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Nem tudo o que reluz é ouro. Mas faz toda a diferença.

Há um tempo atrás, em outra postagem, relatei um curioso fato. As pessoas costumam achar, ao menos inconscientemente, que aqueles falando ao celular estão mais ocupados do que aqueles ao telefone fixo. Se assim não fosse, não perguntaríamos "Está podendo falar?" a alguém que nos atende ao celular -- pergunta esta que nunca fazemos quando ligamos a um telefone fixo (exceto se a voz do outro lado sinalizar que as cordas vocais do nosso interlocutor estão nas últimas).

De fato, julgamos as pessoas por pequenos detalhes, que atuam como uma espécie de mensagem subliminar que distorce a realidade. Explorando-se tal característica do comportamento humano, é possível conceber boas estratégias para aumentar a percepção de importância que alguém possui no meio social. Em particular, que nós possuímos.

Façam uma imagem mental de um colega de trabalho. Alguém que não conheçam muito bem. Pode ser aquele cara do andar de cima, com quem vira e mexe esbarramos no café ou no elevador. Pois bem: imaginem tal colega andando pelos corredores, falando alto ao celular e examinando várias folhas de papel na mão, cheias de gráficos de barras, enquanto se dirige apressado a algum lugar (uma reunião, talvez?). Respondam rápido: em uma escala de 1 a 10, quão importante é este seu colega para a empresa? Lembrem-se desta resposta antes de sair novamente da sua mesa para ir ao banheiro sem nada nas mãos e andando como se a vida já estivesse ganha. Agindo conforme o comportamento imaginado do colega, além da imagem positiva que é transmitida, o papel na mão e o andar apressado são em si úteis na atividade de ir ao banheiro.

Um dilema com o qual me deparei recentemente foi a definição do meu status no comunicador (nome corporativo para a aplicação de bate-papo; olha aí mais um exemplo de como um nome modifica todo o sentido). Se deixasse "Livre", isto pareceria sinônimo de "Sem nada útil para fazer". Se fosse "Ocupado", daria a entender que sou incompetente para trabalhar ao mesmo tempo que respondo uma simples mensagem. Portanto, o melhor status que consegui foi "Muito ocupado, mas isto não me impede de tratar de outro assunto". [Um praticante avançado deste tipo de marketing pessoal logo perceberia que o próximo passo natural é dizer ao chefe, quando este o procurar no momento em que se fala com a mãe por telefone, que está ocupado devido a um conference call com a "matriz", mas que ele pode lhe enviar uma mensagem em alguns minutos pelo comunicador...]

Tocando neste assunto...

Eu tenho inúmeros outros exemplos nos quais parecer é mais importante do que ser. Infelizmente, não poderei descrevê-los todos aqui, pois tenho outros compromissos agora. Para aqueles que são meus amigos pessoais, aviso que não adiantará me ligar no meu telefone fixo. Por nunca ter tempo de atendê-lo, terminei por desativá-lo. O celular é uma opção, mas provavelmente terão que deixar um correio de voz -- os quais sempre retorno em menos de dez minutos, entre uma atividade e outra. Garantido.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

De médico e de louco, todo mundo tem um bocado

-- Sabe qual é a maior torcida de futebol do mundo? O Botafogo.

-- Sério, como assim?

-- É comprovado: toda casa tem um fogão.

Foi por ter contado esta ingênua piada que fui chamado de maluco. O pessoal do trabalho a achou horrível, sem graça nenhuma. Até agora, confesso que ainda vejo um charme na anedota.

Depois de muitas risadas e gozações sobre a natureza da minha pseudo-piada (pseudo na opinião deles, é claro), houve um breve silêncio. Todos pararam de rir e começaram a refletir sei lá com o que. Em seguida, alguém disse em tom sério:

-- Olha, falando em maluquice, eu estava andando meio preocupado. De vez em quando, eu ia para cozinha beber água, tirava o copo do armário, enchia de água, e quando percebia estava eu já na sala, mas sem o copo e sem lembrar se eu havia de fato tomado água. Ao voltar à cozinha, descobria que eu tinha era guardado o copo dentro do armário, cheio de água. Graças a Deus, faz três dias que isto não acontece...

Depois de umas risadas, desta vez em menor grau, alguém complementou:

-- E eu? Toda vez que passava por uma cancela de veículos -- no estacionamento de supermercados, shopping centers, rotativos, etc. -- tentava usar o controle remoto da minha garagem para abri-la. Só depois de tentar várias vezes e começar a ficar irritado por ela não levantar, percebia a confusão.

As risadas escandalosas foram substituídas por leves sorrisos. Em tom de desabafo, outro tomou a palavra:

-- Estes dias, estava digitando o meu andar no elevador, quando alguém do lado me perguntou: "Por que você está digitando tantos números?". Neste momento, percebi que estava digitando no painel numérico do elevador, na verdade, a minha senha do banco.

As risadas sumiram. Os outros, um após um, contaram seus casos de devaneios. No final, voltamos todos a trabalhar. No lugar de gozações, restaram receios. Sob esta perspectiva, achar graça na piada do Botafogo pode até ser classificado como um ato genial, não? (Guardem seus comentários.)

Tocando neste assunto...

Na verdade, houve uma pessoa que não contou nenhum caso pessoal. Ao invés, ainda soltou um comentário "Vocês são todos loucos!..." baixinho antes de voltar ao trabalho. Por acaso, cinco minutos depois, procurei este tal colega para conversarmos sobre um problema. Ao chegar na sua mesa, o encontrei com headphones, dançando da cintura para cima, sentado na cadeira, enquanto digitava ao computador. Só espero que ele estava dançando no ritmo da música que estava escutando, e não naquele de uma outra música, nem muito menos fazendo movimentos aleatórios. Caso contrário, o buraco no caso dele seria muito mais embaixo.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Sobre decepções e desculpas esfarrapadas

Sabe aquela decepção que bate quando tínhamos uma sensação de que algo de errado estava acontecendo e descobrimos, tempos depois, que não só era verdade mas também que ela estava o tempo todo debaixo do nosso nariz e não percebemos? Pois é, meus amigos, isto aconteceu comigo. Mas como diria o homem dentro do armário: Calma! Não é nada do que estão pensando! O problema foi que descobri, lendo o artigo recente do blog da Silmara, dois fatos desta natureza.

O primeiro, é que as mulheres mentem sobre os preços das (infindáveis) peças de vestuário que adquirem. Se eu já achava um absurdo, prefiro nem investigar, por motivos médicos, o quanto esta informação me chega distorcida.

O segundo, é que a desculpa que dou quando me ligam em nome de alguma instituição de caridade, aquela de não poder contribuir por já ajudar a outras instituições, é muito esfarrapada -- todo mundo usa. Fiquei perplexo ao saber disso. Achava que era original, e que ninguém desconfiava que era apenas uma desculpa. Em retrospectiva, imagino agora que cada atendente do outro lado da linha torcia o nariz enquanto eu, do lado de cá, achava que estava abafando. O pior de tudo é que, ainda por cima, a desculpa basicamente é uma mentira. Francamente, Fabiano, que papelão!

Tocando neste assunto....

Uma vez, dado o peso na minha consciência de ficar negando ajuda a idosos abandonados em asilos e crianças que precisam de remédios para câncer, decidi que devia ajudar. Mas antes de efetivar a ajuda, resolvi pedir o CNPJ, a página, ou qualquer informação que fornecesse credibilidade ao pedido. A atendente desconversou e desligou o telefone. Semanas depois, mesma coisa em outra ligação. É uma pena que haja ou entidades muito mal organizadas na ação de solicitar ajuda, ou pessoas tão sem coração de quererem lucrar com este tipo de assunto. Mais uma decepção.

O mundo era perfeito

Quando eu era criança, eu achava que o mundo era perfeito. Não que eu tivesse nascido em berço de ouro, muito pelo contrário. E nem que eu t...