quinta-feira, 21 de julho de 2011

Você sabe quanto custa um filho?

Hoje a minha esposa me enviou um e-mail. Achei que seria para me lembrar que ainda não troquei a lâmpada da cozinha que queimou há uma semana. (Hoje, saí de mansinho para evitar dela se lembrar e me fazer trocá-la, justo hoje que eu tinha que passar em mil lugares antes de ir para o trabalho. Por isso, estava esperando um e-mail sobre o assunto.)  Mas o conteúdo da mensagem foi diferente. Ela dizia que o umbigo do nosso filho havia caído.

Sim, acabamos de ter mais um filho! Não sei por que, mas os pais tem umas preocupações esquisitas com os filhos pequenos. Por exemplo, quando o umbigo vai cair. Ou se o filho vai engasgar com leite. Ou acordar de madrugada e verificar se ele está respirando -- como se eles pudessem fazer alguma coisa em qualquer um destes casos. Por exemplo, eu nunca vi alguém dizer que teve que ir no hospital ou passou o maior perrengue porque o umbigo não caiu. Alguém que não nunca toma banho de piscina e depois confidencia ao seu melhor amigo: "Cara, não conte a ninguém, mas eu não gosto de piscina por um motivo... o meu umbigo nunca caiu! Veja só a tripa para fora da barriga!". Mas mesmo assim, confesso que fiquei aliviado com a notícia.

Falta mencionar um detalhe sobre o e-mail. Eu estava apenas copiado no correio. Ele teve como destinatário principal uma outra pessoa: o nosso filho, o tal que acaba de nascer. Sim, ele já ganhou uma conta que já deve ter uma dúzia de mensagens. A ideia de criar uma conta para eles surgiu logo que nossa primeira filha nasceu. A propósito, sempre achei que naquela pulseirinha da maternidade, com o nome do bebê e da mãe, já deveria vir um e-mail vitalício: fulaninho.da.silva@cidadao.gov.br. Mas dado que as coisas ainda não são assim, também abrimos uma conta para ela e, desde então, ela já recebeu centenas de e-mails, entre piadas até advertências sobre o comportamento. Ela tem três anos e, portanto, ainda não leu nenhuma das mensagem. Mas poderá ter a chance de acompanhar em retrospectiva o estado de espírito da família em cada momento desde que nasceu -- isso se o Google não desativar a conta dela por inatividade.

Antes de apagar a mensagem, respondi à minha esposa: "Hei, você esqueceu de copiar a nossa filha...". Ela encaminhou a mensagem novamente, desta vez a copiando. Não quero que em 2016, preparando-me para ir a algum ginásio para acompanhar os jogos olímpicos que ocorrerão no Rio, nossa filha dê um piti antes de sairmos porque a mãe trocou e-mail com o pai e o irmão em 2011 sobre a queda do umbigo e ela ficou de fora. Melhor prevenir do que remediar.

Tocando neste assunto...

Durante a faculdade, estava eu conversando com um professor na saída de uma aula. Um sujeito se aproximou e, com toda educação, interrompeu nossa conversa. Era alguém que, pelas saudações e a surpresa do reencontro, conhecia o meu professor desde muito tempo.

-- Mas e aí rapaz, o que fez da vida? Casou? -- perguntou ele ao meu professor.

-- Sim, casei... três filhos, e você?!

-- Uaaau! Três filhos?! Eu casei, mas não temos filhos e nem queremos ter!

De certa forma, senti que a declaração chocou o meu professor.

-- Mas por que não?

-- Ora -- justificou ele, com convicção absoluta do que falava, como se já tivesse pensado no caso por muito tempo -- sabe quanto custa educar um filho até os 24 anos, supondo que ele fique mesmo independente financeiramente aos 24 anos (cada vez mais difícil)? Deve contar jardim de infância, escola, natação, judô, escola de música, curso de inglês e espanhol, plano de saúde, roupa, comida, cinema, médico e por aí vai... 

Meu professor franziu a testa.

-- Hmmm.... não sei... nunca pensei nisso.... você já?

-- Sim... está tudo numa planilha Excel que tenho. Sendo conservador, e levando-se em conta um rendimento de 0,5% mensais se o gasto fosse aplicado, totalizaria um milhão de reais por filho. E isso por baixo! E então, estou muito errado de pensar assim?!

O meu professor ficou pensativo. Talvez por nunca ter se dado conta de argumento semelhante a este, enquanto o seu amigo exibia um sorriso triunfante. Contudo, este seu sorriso deu lugar a uma tremenda cara de surpresa quando ele ouviu a resposta, contendo um argumento que ele, por sua vez, nunca tinha se dado conta:

-- Rapaz, então eu estou levando muita vantagem.... cada filho meu nem chegou ainda aos 24 anos e já valem para mim, cada um, mais do que um milhão.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

As fábulas e suas lições de moral

Estava eu numa livraria na seção infantil (sim, minha filha obviamente estava junto), quando passei os olhos por um livro que consistia de uma coletânea de fábulas. Uma fábula, como todos sabem, é um pequeno conto no qual, escondida em sua ficção, encontra-se uma lição de moral. Neste livro, havia uma proposta interessante: no rodapé de cada página onde trazia-se uma fábula, enunciava-se a lição de moral correspondente. Isto era feito de maneira muito discreta, de modo que a criança pudesse antes refletir sobre o tema e verificar em seguida se a lição que julga ter aprendido casa com aquela apontada pelo autor. Achei interessante a ideia.

Depois de ler algumas fábulas, deparei-me com a que transcrevo a seguir: 
O Boi e a Rã
Um Boi foi beber água num brejo e, acidentalmente, pisa numa ninhada de rãs e esmaga uma delas.

A mãe das Rãs, ao sentir pela falta de um dos seus filhotes, pergunta aos seus irmãos o que aconteceu com ele.

Ele foi morto! Há poucos minutos atrás, uma enorme Besta, com quatro grandes patas rachadas ao meio, veio até a lagoa e pisou em cima dele.

A mãe começa a inchar e pergunta:

A besta era maior do que eu estou agora?

O filho pede para ela parar de inchar - não se aborreça, mas eu lhe asseguro, por mais que tente, você explodiria antes de conseguir ficar o tamanho daquele Monstro.
Fiquei intrigado. Que raio de lição de moral seria aquela?! "Ao atravessar uma rua, além de olhar para um lado e para o outro, olhe também para cima"? "Quem tenta ser maior do que tem condições se mete em encrenca"? "Quem pode, podeç quem não pode, sai de baixo"? Fiquei envergonhado de ter que ler o rodapé sem certeza de qual lição seria. Eis-la aqui: 
Moral da Estória:
Na maioria das vezes, as coisas insignificantes desviam nossa atenção do verdadeiro problema.
Não sei quanto a vocês, mas tive dificuldades de associar a lição com o conto propriamente dito. Seria possível se chegar a esta lição, assim, tão claramente? Acho que a coisa insignificante que desvia nossa atenção, neste caso, é justamente este texto. Seria isto?!

Tocando neste assunto...

Quando eu tinha cinco anos, ao sair da calçada para a rua de bicicleta fui atropelado por uma caminhonete. O acidente foi feio: quebrei três costelas e tive uma perfuração nas costas, na altura do pulmão (muito embora, a cicatriz tenha descido até a cintura, pois a pele foi esticando com o crescimento). Sobrevivi, naturalmente.

Passado o susto, meu pai se recusou dali por diante a botar o pé novamente no mercadinho do bairro. O fato é que aquela caminhonete pertencia a este mercado, que trabalhava fazendo entregas de compras nas residências. Meu pai condenava até a oitava geração do motorista enquanto minha mãe ponderava que tinha sido um infortuito, que o jovem motorista não teve culpa de atropelar uma criança de desceu de repente da calçada de bicicleta. Meu pai não engolia este argumento: "Eu vi na cara daquele safado! Tenho certeza que ele teve culpa de alguma forma!", repetia ele, impiedoso.

Muitos anos depois, minha mãe e eu entramos no mercado para comprar qualquer coisa. Enquanto ela pegava alguns itens entre uma prateleira e outra, parou de repente e, então, puxou-me pelo braço:

-- Fabiano, é aquele moço que lhe atropelou! Você se lembra dele?!

Puxa, era ele então. Ele ainda trabalhava no mercado. Eu não me lembrava de seu rosto, pois eu era muito criança na época.

-- Mãe, acha que devemos falar com ele?

-- Vamos lá.

Ao chegar perto do camarada, minha mãe começou:

-- Ei, você se lembra dele?

O rapaz parou o trabalho e me olhou desconfiado.

-- Olha, sinceramente.... não me lembro não. -- respondeu ele. Minha mãe continuou:

-- Há muitos anos, você o atropelou.

-- Meu Deus, sério? Atropelei como, com qual carro?

-- Foi de caminhonete!

-- Ahhh, sim, é que não dirijo caminhonete há muito tempo, mas já atropelei de caminhonete sim...

Pausa. Notem que o sujeito pelo visto já atropelou de outras formas também. Sabe-se lá Deus de quantas mais. Ele me perguntou:

-- Você morava na Caieras, não?

-- Não, aqui mesmo!

-- Hmmm... -- fazendo cara de quem quer se lembrar -- eu por acaso passei no seu pé?

-- Não, eu estava de bicicleta, e aí...

-- Ah, eu subi na calçada e peguei você!

-- Não, eu que desci na rua e aí você me atropelou!

-- Puxa, mas isto tem muito mais anos que eu imaginava! Estava tentando me lembrar de casos mais recentes. Rapaz, como é bom te ver assim, bom de saúde!

Ao sair daquele mercado, minha mãe xingava até a décima-quarta geração daquele camarada.

Moral da estória? Como no caso da fábula "O Boi e a Rã", a minha intuição é que deve sim existir uma lição a ser aprendida. O problema é encontrá-la.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Procura-se um instrutor de informática

Há 15 anos, os "cursinhos" de informática -- cursos que oferecem treinamento de programas básicos, como Windows, Word, Excel, etc. -- proliferaram. Hoje, quase não os vemos mais.

Eu cheguei a trabalhar dois anos como instrutor de informática. Eu era muito jovem na época, mas era uma exceção. Boa parte daqueles profissionais que conheci lecionava já por dez, quinze anos. Começaram numa época em que para se usar um computador sem vender um rim para comprar um era necessário se matricular num destes cursos. Hoje em dia, computador se tornou item básico da maioria das residências, tanto quanto um telefone fixo. Todo mundo, bem ou mal, sabe usar. Isto explica o fato de que tais cursos praticamente se extinguiram. O que será que foi feito destes instrutores "da antiga"? Espero que estejam todos bem realocados no mercado. De trabalho.

Tocando neste assunto...

Refletindo sobre o tema, me vem à cabeça a minha primeira aula. Cheguei mais cedo para conhecer um a um os alunos que chegariam. O primeiro a chegar foi o Sr. Hélcio. Com uns 65 anos, era um aposentado que buscava nas atividades extracurriculares algo para se ocupar. Depois de conversarmos por algum tempo, ele me perguntou:

-- E aí, será que este professor vai ser bom mesmo? Dizem que ele é novinho...

Bem, eu não havia me introduzido como o professor propriamente dito. Então ele, sabendo dos meus dezessete anos, presumiu que eu também era aluno. Ele ficou tão constrangido em saber da situação quanto eu em explicá-la.

Quando os alunos terminaram de chegar, comecei a aula. Depois daquela introdução básica (quem é você? o que busca no curso? o que faz da vida? etc.), comecei uma explicação teórica da computação antes de colocar a mão-na-massa e deixá-los utilizar os computadores. Esta parte era meio longa, na qual expliquei notação binária, conversão entre bases, a motivação da concepção de um bit, a razão pela qual um byte tem 8 bits, entre outros assuntos. Pelas caras, no entanto, achei que a minha aula seria um fiasco. Ninguém parecia interessado (usando-se um eufemismo). Lá pelas tantas, ainda por cima, um pré-adolescente começou a fazer barulho de sapo toda vez que eu mencionava memória RAM. Achei que a coisa não funcionaria mesmo.

Mas felizmente me enganei. Assim que eles começaram a ligar os computadores para darem seus primeiros comandos (ah sim, naquela época a aula era de DOS, o precursor do aplicativo Prompt de Comando na pasta Acessórios do Windows atual), a aula mudou de cara. A turma ficou empolgada. Logo vi que teoria não interessaria àquela turma. Mais tarde, descobri que teoria não interessava na verdade a nenhuma turma.

A aula então transcorreu perfeita. A turma se interessou, começaram a responder as perguntas (talvez por começarem a entendê-las), a participar das discussões. No final da aula, pedi que todos colocassem um disquete no drive para salvarem seus trabalhos para a próxima aula. Para os leitores mais novos, um drive de disquete era como um drive de DVD que ao invés de se abrir uma portinha para acessá-lo, bastava colocar um disquete lá dentro do buraco que havia nele. O seu propósito era como aquele de uma pendrive -- guardar arquivos -- com a diferença de que no lugar dos usuais 4 GB de espaço que uma pendrive possui, um disquete de 5 1/4" armazenava 720KB.

Uma menina então levantou a mão:

-- Professor, o meu disquete não funcionou!

-- Como você sabe que não funcionou?

-- Ele está dizendo que é para eu inserir um disco na unidade, mas eu já inseri.

-- Deixe-me ver.

Quando cheguei perto, onde estava o disquete? Ele não estava no drive!

-- Mas professor, eu não o coloquei neste buraco em que está procurando. Eu coloquei neste aqui!

A garota havia jogado o disquete dentro da fresta formada pela colocação do drive no gabinete. Não me restou o que fazer senão pegar uma chave Phillips e abrir a CPU para tirar o disquete de lá de dentro. Aproveitei a aglomeração de curiosos em volta ávidos por saberem como era um computador "por dentro" para enumerar e descrever os diversos componentes. Notei que isso deu ainda mais IBOPE. Tanto foi que, em todo curso dali por diante, abrir computador passou a ser a primeira coisa que eu fazia. Nem curso de Word era exceção desta estratégia. E não falhava nunca.

O mundo era perfeito

Quando eu era criança, eu achava que o mundo era perfeito. Não que eu tivesse nascido em berço de ouro, muito pelo contrário. E nem que eu t...