segunda-feira, 11 de julho de 2011

As fábulas e suas lições de moral

Estava eu numa livraria na seção infantil (sim, minha filha obviamente estava junto), quando passei os olhos por um livro que consistia de uma coletânea de fábulas. Uma fábula, como todos sabem, é um pequeno conto no qual, escondida em sua ficção, encontra-se uma lição de moral. Neste livro, havia uma proposta interessante: no rodapé de cada página onde trazia-se uma fábula, enunciava-se a lição de moral correspondente. Isto era feito de maneira muito discreta, de modo que a criança pudesse antes refletir sobre o tema e verificar em seguida se a lição que julga ter aprendido casa com aquela apontada pelo autor. Achei interessante a ideia.

Depois de ler algumas fábulas, deparei-me com a que transcrevo a seguir: 
O Boi e a Rã
Um Boi foi beber água num brejo e, acidentalmente, pisa numa ninhada de rãs e esmaga uma delas.

A mãe das Rãs, ao sentir pela falta de um dos seus filhotes, pergunta aos seus irmãos o que aconteceu com ele.

Ele foi morto! Há poucos minutos atrás, uma enorme Besta, com quatro grandes patas rachadas ao meio, veio até a lagoa e pisou em cima dele.

A mãe começa a inchar e pergunta:

A besta era maior do que eu estou agora?

O filho pede para ela parar de inchar - não se aborreça, mas eu lhe asseguro, por mais que tente, você explodiria antes de conseguir ficar o tamanho daquele Monstro.
Fiquei intrigado. Que raio de lição de moral seria aquela?! "Ao atravessar uma rua, além de olhar para um lado e para o outro, olhe também para cima"? "Quem tenta ser maior do que tem condições se mete em encrenca"? "Quem pode, podeç quem não pode, sai de baixo"? Fiquei envergonhado de ter que ler o rodapé sem certeza de qual lição seria. Eis-la aqui: 
Moral da Estória:
Na maioria das vezes, as coisas insignificantes desviam nossa atenção do verdadeiro problema.
Não sei quanto a vocês, mas tive dificuldades de associar a lição com o conto propriamente dito. Seria possível se chegar a esta lição, assim, tão claramente? Acho que a coisa insignificante que desvia nossa atenção, neste caso, é justamente este texto. Seria isto?!

Tocando neste assunto...

Quando eu tinha cinco anos, ao sair da calçada para a rua de bicicleta fui atropelado por uma caminhonete. O acidente foi feio: quebrei três costelas e tive uma perfuração nas costas, na altura do pulmão (muito embora, a cicatriz tenha descido até a cintura, pois a pele foi esticando com o crescimento). Sobrevivi, naturalmente.

Passado o susto, meu pai se recusou dali por diante a botar o pé novamente no mercadinho do bairro. O fato é que aquela caminhonete pertencia a este mercado, que trabalhava fazendo entregas de compras nas residências. Meu pai condenava até a oitava geração do motorista enquanto minha mãe ponderava que tinha sido um infortuito, que o jovem motorista não teve culpa de atropelar uma criança de desceu de repente da calçada de bicicleta. Meu pai não engolia este argumento: "Eu vi na cara daquele safado! Tenho certeza que ele teve culpa de alguma forma!", repetia ele, impiedoso.

Muitos anos depois, minha mãe e eu entramos no mercado para comprar qualquer coisa. Enquanto ela pegava alguns itens entre uma prateleira e outra, parou de repente e, então, puxou-me pelo braço:

-- Fabiano, é aquele moço que lhe atropelou! Você se lembra dele?!

Puxa, era ele então. Ele ainda trabalhava no mercado. Eu não me lembrava de seu rosto, pois eu era muito criança na época.

-- Mãe, acha que devemos falar com ele?

-- Vamos lá.

Ao chegar perto do camarada, minha mãe começou:

-- Ei, você se lembra dele?

O rapaz parou o trabalho e me olhou desconfiado.

-- Olha, sinceramente.... não me lembro não. -- respondeu ele. Minha mãe continuou:

-- Há muitos anos, você o atropelou.

-- Meu Deus, sério? Atropelei como, com qual carro?

-- Foi de caminhonete!

-- Ahhh, sim, é que não dirijo caminhonete há muito tempo, mas já atropelei de caminhonete sim...

Pausa. Notem que o sujeito pelo visto já atropelou de outras formas também. Sabe-se lá Deus de quantas mais. Ele me perguntou:

-- Você morava na Caieras, não?

-- Não, aqui mesmo!

-- Hmmm... -- fazendo cara de quem quer se lembrar -- eu por acaso passei no seu pé?

-- Não, eu estava de bicicleta, e aí...

-- Ah, eu subi na calçada e peguei você!

-- Não, eu que desci na rua e aí você me atropelou!

-- Puxa, mas isto tem muito mais anos que eu imaginava! Estava tentando me lembrar de casos mais recentes. Rapaz, como é bom te ver assim, bom de saúde!

Ao sair daquele mercado, minha mãe xingava até a décima-quarta geração daquele camarada.

Moral da estória? Como no caso da fábula "O Boi e a Rã", a minha intuição é que deve sim existir uma lição a ser aprendida. O problema é encontrá-la.

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Quando eu era criança, eu achava que o mundo era perfeito. Não que eu tivesse nascido em berço de ouro, muito pelo contrário. E nem que eu t...